Songs of Surrender do U2: O álbum que a gente acha que não precisa
Tem se falado muito sobre o novo álbum do U2, Songs of Surrender. Primeiro eu gostaria de falar uma coisa. Uma das lições que eu aprendi com meu antigo chefe no site Atu2, Matt McGee, foi que nós não somos relações públicas do U2. Nós somos livres pra criticar o que quisermos, e isso não nos torna menos fãs. Eu não sei se porque sou jornalista, mas eu sou crítica e consigo ver coisas que eu não curto muito na carreira da banda — mesmo sendo uma super fã há mais de 30 anos! Eu acho que é impossível a gente gostar de todos os álbuns do U2 com a mesma intensidade.
Entretanto, algumas pessoas não conseguem distinguir as diferenças nos trabalhos do U2. Eu sei que ser fã envolve muita emoção, e às vezes, esses sentimentos nos deixam “cegos”. Então, tudo o que fazem é perfeito. Eu consigo entender isso. Além disso, há outro tipo de gente que tem conexões com o staff e possui vantagens o tempo todo. É conveniente para eles não criticarem nunca a banda em público. Obviamente, eles querem manter esses benefícios, brindes, presentes, etc. Este não é o meu caso. Por isso, essa é uma visão bem honesta do mais recente disco do U2.
Enquanto eu estava pensando sobre este álbum, eu me fiz algumas perguntas. Songs of Surrender é uma consequência da pandemia. Você consegue imaginar o The Edge em casa durante o lockdown não fazendo nada por meses e meses? É evidente que ele é workaholic, viciado em trabalhar, e provavelmente ele iria produzir alguma coisa neste tempo. Outro ponto a ser considerado é que o Bono lançou uma biografia chamada “Surrender: 40 músicas, uma história”, e junto tem também uma versão em audiobook. E, depois, ele anunciou uma turnê para promover o livro. As músicas do U2 são a trilha sonora da história e ele precisava re-imaginar essas canções para seu show sem o resto da banda.
Eu realmente não sei por que o U2 nunca lançou um álbum acústico. Me lembro de vários artistas, era sempre um sucesso na MTV. Talvez eles achassem que eram muito jovens pra isso nos anos 90. Apesar de Songs of Surrender não ser totalmente acústico, agora como uma banda madura eles sentiram a necessidade de re-visitar essas músicas com mais intimidade. Com a idade vem a reflexão e as prioridades mudam. A gente começa a se preocupar com o que é mais essencial, então menos acaba sendo mais.
Negativo: O disco é basicamente Bono e Edge. Eu sinto falta do Adam e Larry. É isso! Eu acho bom quando os artistas trabalham separadamente, em outros projetos, e eu apoio isso porque eu acredito que eles desenvolvam mais suas habilidades e ganham mais inspiração. Mas me incomoda ver 50% da banda usando o nome U2. Você pode dizer que eu estou fazendo drama, mas o documentário da Disney Plus é chamado “Bono & The Edge: A Sort of Homecoming”. Não é U2. Mesmo assim, eu ainda sinto falta da outra metade da banda. Isso é até expressado na capa do álbum, onde a foto do Bono é a única de uma era diferente do restante da banda. Por quê? Eu acho que não combina. Não consigo entender a razão pra isso.
Positivo: É um novo projeto! As músicas são antigas, mas eles ainda estão trabalhando. Eu não sei o que faria se eu fosse milionária, mas depois de tantos anos na estrada eu acredito que eles poderiam passar o resto da vida na praia no sul da França, ou curtindo Nova Iorque. Depois de quase 50 anos de banda, eles têm o direito de estarem aposentados. Mas eles não estão! E eu, como fã, estou feliz com isso.
Eu escutei o álbum todo e em geral eu gostei muito! Eu acho que estava um pouco assustada com a primeira música que foi lançada. Talvez eu não soubesse exatamente o que esperar. Claro, nem todas as músicas funcionam pra mim. Algumas eu prefiro as versões originais. Mas como o Edge disse, numa entrevista recente, não é uma competição. Há diversos arranjos novos que são muito interessantes. As vezes, parece que o Bono está sussurrando no meu ouvido, ou o Edge está me dando conselhos. Apesar da enorme distância entre o Brasil e a Irlanda, eu os sinto mais próximos. A profundidade de algumas músicas me acalma, outras me fazem refletir, pensar na minha vida, nos meus sentimentos. Como disse anteriormente, tudo o que o U2 fizer agora é bem vindo. Se me perguntassem se esse disco era realmente necessário, eu provavelmente diria que não. Talvez não fosse mesmo, mas com o tempo eu acho que todos nós seremos gratos por mais um disco do U2.
Fernanda Bottini
Comunicação — Jornalista
Fã do U2, que escreve sobre a banda irlandesa há 20 anos
Contato: febottini@gmail.com